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quarta-feira, 27 de junho de 2012

RELAÇÕES AFETIVAS


Até nós, pais, entendermos o lado da Tourette que não é bem explicado, tudo se complica. A relação afetiva fica deteriorada. É como se o laço que nos une estivesse se puindo. Isso envolve a todos que convivem de perto com a doença.

Eu não conseguia entender o que se passava com meu filho, tudo estava mudando e os livros não explicavam isso. Às vezes, eu achava que era eu que não sabia ser mãe, e isso me machucava. O médico dizia que podia ser da adolescência , que o pai devia está mais presente; justificava que nessa idade, o filho precisa da presença masculina. Ele tinha pai e o pai era presente. Trabalhava, mas era presente.

Eu fiquei péssima. De um lado, estava meu filho que não queria estudar, que se descontrolava por nada, vivia nervoso, discordava de tudo, não parava de reclamar. E do outro, meu filho mais novo assistia a tudo de camarote. Via o irmão que ele tanto amava desse jeito e me via chorar,colocar o irmão de castigo, brigar, gritar.

Era difícil para mim ver minha família no caos por causa de uma síndrome e não poder fazer nada. A dúvida existia sempre, ninguém tem noção de quantos livros eu li, outros eu comprei e no meio eu desistia de ler, porque o que eu tentava fazer não servia e os livros só nos deixavam mais frustados.

Quanto mais punição eu aplicava, mais as coisas se complicavam. Enquanto eu estava péssima, por não saber impor limites, por não conseguir que meu filho voltasse a ser quem ele era, por nossas vidas passou um furacão. A sensação é essa: deixar a Tourette te vencer.

Mas eu sou neta de teimosa, filha de teimosa e não podia ser diferente: também sou teimosa. Continuava me perguntando o que eu estava fazendo errado. Meu filho criou aversão de estudar comigo e eu quase pirei. Mas, surgiu a professora particular para acalmar os ânimos. Quase perco o amor do meu filho, muito mais importante que escola, muito mais importante que letras, muito mais importante que regras.

Ele não me ouvia, estavamos perdidos e nenhuma luz. Tudo acontecia ao mesmo tempo e ainda não era todos os dias. Insisti com o neuro se precisava levá-lo ao psiquiatra, mas não tive resposta. Eu confiava plenamente no tratamento, mas não tinha explicação.

A psicóloga do meu filho me cobrava um psiquiatra, eu fugia sempre, tinha medo de mudar e ser a responsável por um possível erro. Mas que erro, se tudo estava uma bagunça?

Eu não aceitava a Tourette ainda e,  pior que isso, eu não era íntima dela, ela não era minha companheira, eu odiava essa síndrome que fazia meu filho sofrer. Nesse tempo, eu ainda não abria para todo mundo as portas da Tourette. E eu, uma mãe apaixonada, não compreendia meu filho. Hoje, eu imagino como ele se sentia.

Com 12 anos, tudo piorou. A letra ficou ilegível. Eu já tinha prática, mas os professores, não. Já não copiava tudo e começou uma enorme dificuldade em matemática. No meio disso tudo, ainda tinham as compulsões e pensamentos que se repetiam sempre.

Os medicamentos eram trocados, ele dormia sem parar, não assistia TV, não jogava, não brincava. Bati muito nessa tecla com o médico e medicamentos iam e vinham. Eu queria uma comunicação maior, um entendimento de tudo. Cada vez mais as coisas se complicavam e meu filho sofria. O descontrole era comigo; depois me arrependia como se o movimento do pensamento terminasse. Comportamento na escola: normal. Era só comigo.

Por mais que eu colocasse regras e limites, ele não aceitava.

Foi tudo acontecendo lentamente, aos 8 anos de idade e crescendo. Nada passou sem que eu notasse. E, como um furacão , aos 11 anos e meio, tudo explodiu. Fui apertada por várias chaves de fenda protetoras e, finalmente, quase que forçada, levei-o para uma psiquiatra.

Um medo que só Deus sabe explicar. E ela teve que mudar tudo. A responsabilidade era minha - concordar ou não -, deixar o outro médico ou não, o que fazer era decisão nossa.


Depoimento de Daniela Torres, editora do blog Nossas Vidas com Tourette e mãe de um garoto com Tourette

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